Castelo de Guimarães

Paradigma das origens da nacionalidade e da própria figura de D. Afonso Henriques, acreditando-se que foi aqui que nasceu e passou a sua infância e juventude, o Castelo de Guimarães é a imagem emblemática do castelo medieval português. Ao longo da história, foi palco de vários conflitos reais e nele encontramos um misto de heroísmo e de lenda que marca o início da História de Portugal.
No Dia Nacional dos Castelos, é o Castelo ideal para se falar, ou não fosse ele tido como o lugar mais emblemático da castelologia nacional.

Isolado no topo de um pequeno monte de afloramento granítico, situando-se no Monte Largo – “alpis latitus” no latim de documentos da época, o Castelo de Guimarães foi construído na segunda metade do século X, a mando da Condessa Mumadona Dias, recém viúva e agora responsável pelo governo do Condado Portucalense. Quando assume este lugar, toma duas medidas de grande importâncias: a construção do Mosteiro de Santa Maria na parte baixa da cidade, por volta de 950; a construção do Castelo de S. Mamede na parte alta, entre os anos 950 e 970, sendo esta uma forma de se afirmar perante os restantes senhores feudais. O primitivo Castelo de Guimarães surge com a necessidade de proteger os religiosos e as populações que então aí se fixaram dos constantes ataques dos Mouros e dos Normandos.
A 4 de Dezembro de 968, num documento codicilar, a Condessa refere-se ao Castelo como já estando construído e doa-o ao Mosteiro que visa defender.

A configuração actual revela muito pouco das suas formas originais que fazem dele um clássico exemplo dos “castelos condais”, do qual não se verificam vestígios arqueológicos desta primeira construção, principalmente porque terá sido construído em madeira. Deverá ter sido erguido entre penedas as quais melhoravam as suas condições defensivas.

Um dos primeiros exemplos “de uma estrutura castelar erguida para assegurar a protecção de um mosteiro, um binómio que se viria a verificar muitas outras vezes nas centúrias seguintes”.

– Mário Jorge Barroca, 1996*.

Entre os finais do século X e a primeira metade do século XI assistimos a vários anos de troca de terras entre familiares. Gontronde, irmã de Mumadona, doa o Castelo e tudo o que lhe pertencia, em 1045.

É nesta altura que aparecem o Conde D. Henrique e D. Teresa, então Condes de Portucale. No final do século XI, ordenam a remodelação e ampliação do Castelo de modo a utilizá-lo como sua residência e tornando-o mais forte. Começam por demolir parte da construção original de modo a ampliar a área ocupada, pondo em prática uma técnica já próxima do Românico. O pátio seria quase coincidente ao dos dias de hoje, com planta arredondada, mas sem atingir as extremidade da estrutura actual – um pátio rodeado por muralha e nada mais.
Os vestígios desta fase encontram-se na zona da entrada: cinco fiadas de silhares de grandes dimensões definem uma parede arqueada com uma sapata pronunciada. Foi esta a estrutura que enfrentou Afonso VII de Leão e Castela quando levantou cerco ao ainda infante D. Afonso Henriques.

É então em 1128 que se trava a famosa Batalha de São Mamede a qual tem lugar no campo do mesmo nome e que é visível a partir do Castelo. Aqui temos a origem da independência e da fundação da nacionalidade, levando D. Afonso Henriques (1109-1185) ao trono como primeiro Rei de Portugal.
No século XII, é com ele que vemos ser ampliada a muralha que passa a percorrer o perímetro ainda dos dias de hoje. É aqui que aparece o adarve embora mais baixo do que o actual, do qual existem vestígios ao longo de toda a muralha.

Na segunda metade do século XIII, provavelmente durante o reinado de D. Dinis constroem-se alguns dos elementos mais característicos do Castelo de Guimarães como a torre de menagem, os oito torreões adossados à muralha, a qual é também alterada – elementos de uma fase de intervenção muito importante, sendo que é aqui que o Castelo adquire o aspecto que vemos hoje em dia. Esta reconstrução é já de cariz Gótico.

Esta reforma Gótica acontece quando as muralhas da cidade estavam a ser intervencionadas. Nesta altura, a fronteira do reino estava cada vez mais afastada desta zona e por isso o Castelo desempenhava um papel mais secundário. Ainda assim, foi fundamental na Guerra Civil de 1321-1324, na qual se opuseram D. Dinis ao infante D. Afonso, herdeiro ao trono, sendo o ponto culminante da mesma em 1322 com o chamado Cerco de Guimarães.

O Castelo de Guimarães é novamente cercado entre 1369 e 1385 é cercada por D. João I, Mestre de Avis. É ele quem vai ordenar a construção das torres que protegem as portas da muralha, algo que acontece entre 1383 e 1433.
Em 1389, D. João I unificou a parte baixa e alta da povoação de Vimaranes, juntando-as no concelho que hoje conhecemos como Guimarães. É também com ele que se dá a última reforma no Castelo.

Nesta segunda dinastia, já no século XV e ainda a mando de D. João I, parte do Castelo é privatizado com a construção de duas novas estruturas: o Paço do Alcaide no interior do Castelo, com quatro andares – os dois primeiros destinados a zonas de serviço e os outros dois a zona residencial; e, no exterior, foi erguida uma Barbacã da qual hoje existem apenas vestígios dos seus alicerces – aparece na planta da cidade de c. 1570. Dá-se, assim, a derradeira renovação do velho castelo medieval.

A partir de finais do século XV começa a perder a sua importância militar e estratégica, sendo que as fronteiras continuavam a alargar e eram agora utilizadas armas de fogo, não sendo mais necessário como ponto de defesa.

Entre 1692 e 1895 serviu como cadeia da cidade e no século XVII acumula as funções de palheiro real e de pedreira.

No século XVII, o Castelo atingira já o abandono e a ruína, havendo quem apelasse ao cuidado da construção, tal como os procuradores de Guimarães nas Cortes fizeram em 1653: que se valesse ao Castelo da vila, o mais sumptuoso do reino, que estava a arruinar-se e se lhe não acudissem, se arruinaria de todo e que o concerto fosse à custa das rendas que o Alcaide-mor tinha na vila. E que os muros, também os melhores do reino, se não se alimpassem cairiam arruinados, acudindo-se igualmente às torres deles com um pouco de reparação**. Sobre estes muros diz-se, em 1793, que são já inúteis devido ao seu estado de ruína, mostrando como nada se faz no espaço de quase 150 anos.

O século XIX é marcado por duas vontades contraditórias. Em 1836, um membro da Sociedade Patriótica Vimaranense (associação criada para promover os interesses progressistas locais) propõe a destruição total do Castelo de modo a que a pedra pudesse ser utilizada para pavimentação de arruamentos. Apesar de algumas pedras terem sido retiradas para tal fim (levando à destruição do Paço do Alcaide e da Barbacã), a ideia não avançou e na segunda metade do século XIX são feitas expropriações de casas, quintas e casebres ao redor do Castelo com o intuito de o desafogarem.

O abandono e a degradação progressiva vão continuar até ao momento em que, no século XX, o Castelo de Guimarães é declarado Monumento Nacional, incentivando a que se realizassem obras de intervenção no seu interior.

Nesta altura, entra o Estado Novo em cena, sendo ele responsável pela profunda intervenção de restauro entre 1936 e 1940, mas também pelo fomento do valor emblemático incontornável dado ao Castelo ao longo dos anos, criando encenações ancoradas em glórias passadas e palpitações nacionalistas. Trabalho que vai levar a cabo em outros castelos como, por exemplo, o Castelo de Almourol.

Em 1937, iniciam-se os trabalhos de restauro no Castelo, inseridos num programa de restauro e celebração da Idade Média portuguesa levado a cabo pela Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, entretanto já extinta. O projecto arquitectónico ficou a cargo de Rogério de Azevedo, um dos principais nomes do restauro patrimonial em Portugal na primeira metade do século XX.

O Castelo de Guimarães é inaugurado a 4 de Junho de 1940, por ocasião da comemoração dos centenários – Fundação da Nacionalidade (1140) e Restauração da Independência (1640).

Já no século XXI, em 2015, é inaugurada a primeira fase de obras da qual faz parte a requalificação do pátio e a criação de passadiços e protecções no adarve da fortificação. Quando inaugura, a torre abre como Centro Interpretativo.
A 24 de Junho de 2016, após obras de conservação, a torre de menagem é reaberta ao público.

Esta torre de menagem caracteriza singularmente o monumento, sendo que a sua verticalidade quebra a arquitectura horizontal do Castelo. A sua planta quadrangular tem cerca de 27 metros de altura, divididos em três pisos individuais, com tectos e pavimento em madeira, que se comunicam por uma escadaria. O segundo nível é acessado através de um passadiço de madeira que comunica com o caminho da ronda.

A estrutura de cantaria de granito mostra-se em planta rectangular pentagonal rodeada por uma muralha com oito torres, quatro dos quais enquadram as duas portas de entrada. A Norte e a Sul, a muralha prolonga-se por mais um pouco, estando noutros tempos ligada à muralha de protecção da cidade. A muralha e as torres são rematadas por merlões chanfrados, alguns dos quais rasgados por seteiras, e ainda por ameias pentagonais de corte pontiagudo. A muralha contém ainda um caminho de ronda ao qual se tem acesso por duas escadarias. Do lado interior Norte existem vestígios da alcáçova outrora adossada à muralha, dividida em dois pavimentos com janelas exteriores e duas chaminés.

Nas suas imediações podemos ver um medalhão de bronze de D. Afonso Henriques, a Igreja Românica de São Miguel do Castelo, o Paço dos Duques de Bragança e alguns troços da muralha que circundava a cidade.
A Igreja de São Miguel é onde está a pia que se afirma ter servido no baptizado de D. Afonso Henriques.

Interior da Capela de São Miguel.

Medalhão em bronze de D. Afonso Henriques.

Vista do Castelo de Guimarães para o Campo de S. Mamede.

Vista do Castelo de Guimarães para o Paço dos Duques de Bragança.

A título de curiosidade, o Castelo de Guimarães foi o primeiro Castelo português a ter registos fotográficos que mostram como se encontrava a estrutura no século XIX. Essas imagens são da autoria de Frederik William Flower, que viveu alguns anos no Porto e foi pioneiro na utilização da técnica fotográfica.

Mini-Cronologia do Castelo de Guimarães:
*em 1881, é classificado como Monumento Nacional;
*a 19 de Março de 1881 é incluído na primeira lista patrimonial que Portugal conheceu, classificado em Diário do Governo como o único monumento histórico de primeira classe em todo o Minho;
*a 30 de Abril de 1952 é publicada a fixação da Zona Especial de Protecção Conjunta do Castelo de Guimarães, Igreja de São Miguel e Paços dos Duques de Bragança;
*em 1987, durante a abertura de valas para a instalação eléctrica no Parque do Castelo, é descoberto um poço, possivelmente medieval;
*em 1966, 1981 e 1986 são realizadas obras menores;
*a 1 de Junho de 1992 é afecto ao Instituto Português do Património Arquitectónico;
*incluído na área de Guimarães que desde 2001 é classificada como “Património Cultural da Humanidade”;
*em 2004, novas escavações no interior do Castelo revelam estruturas datáveis do século X.

Sejam as histórias a ele associadas verdadeiras ou falsas, não podemos deixar de reconhecer como o Castelo de Guimarães teve importância para o contexto político e social da época, vendo-se passar por várias fases. Desde ponto de defesa da cidade de Vimaranes, a residência dos Condes de Portucale e possível local de nascimento de D. Afonso Henriques, para depois passar por toda uma fase de abandono da qual ressuscita nos anos 1930, tornando-se um monumento bastante visitado no país.

Um local que carrega séculos de História e lenda, culminando num Castelo medieval de imagem Românica e Gótica, mostrando bem as fases construtivas pelas quais foi passando.

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Referências:
Visita ao Castelo de Guimarães;
Almanaque Literário – Castelo de Guimarães e o Reino de Portugal;
Castelos de Portugal – Castelo de Guimarães;
Cultura Norte – Castelo de Guimarães*;
Monumentos.Gov – Castelo de Guimarães**;
Município de Guimarães – Castelo;
Paço dos Duques – Castelo de Guimarães – História, Castelo de Guimarães: Aqui Nasceu Portugal e Evolução Construtiva do Castelo de Guimarães;
Visit Portugal – Castelo de Guimarães.

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